“Dia Lindo” para seres quem queres ser

A jovem minhota, Fábia Maia, tirou o curso de Ciência Política e Relações Internacionais (CPRI) na Universidade da Beira Interior,  atualmente estuda Naturopatia no Instituto Português de Naturologia, mas tenciona fazer da música um emprego a tempo inteiro. A barcelense Fábia, finalista do Festival da Canção 2021, começou por ver na música um “porto seguro” e  sempre teve o sonho de a vir a ser como o seu ídolo, Avril Lavigne.

Através da influência da sua avó, começou a aprender a tocar guitarra e, mais tarde, através dos seus covers, fez artistas como Jimmy P e Valete renderem-se ao seu talento. Após diversas provações e obstáculos, Fábia percebeu que tinha que se aceitar como era, transmitindo a sua essência e tudo aquilo em que acredita, pela música.


Sempre de mão dada com a parte humanitária, confessou-nos que, espera um dia conseguir levar a sua música além-fronteiras, e que o lançamento do seu 1.º álbum “Avariações” foi um grande passo na concretização deste sonho.

Olá Fábia, em primeiro lugar quando é que descobriste a música?

Eu descobri a música quando tinha os meus 10 anos e dediquei-me muito a ela. Não foi por imposição, mas sim porque a minha avó “forçou” um bocado. Ela fez questão de fazer um “pé-de-meia” para que eu pudesse aprender a tocar o instrumento que queria – a guitarra. Isto foi na altura que saiu o “Let Go” da Avril Lavigne, em 2003, e foi aí mesmo que eu comecei a consumir a música de verdade. Aliás eu queria ser como ela.

Comecei a perceber, nessa idade, que tinha muita vergonha de cantar. Eu gostava era de tocar guitarra para os outros. Mas quando comecei a perceber que cantar me fazia bem, comecei a investir e a fazer letras minhas.

Quando é que percebeste que cantar e compor era o que querias fazer?

Eu já escrevia desde miúda, coisas aleatórias que a minha avó guardava. Aliás a minha avó, antes de falecer, deu-me acesso a uma gavetinha que ela tinha, onde guardava os papelinhos que eu escrevia sobre coisas do mundo. Mas foi efetivamente quando eu fiz os meus primeiros covers e vi que os vídeos tiveram a amplitude que tiveram! É que há seis anos atrás, ter 50 000 views no YouTube era imenso…

E eu, quando percebi que estava a ser convidada para cantar com o Valete, o Jimmy P… Ou seja, que rappers me estavam a convidar, pensei – Não! Eu vou fazer as minhas coisas porque eu também tenho histórias e pensamentos para contar! – E foi aí que eu percebi que queria fazer música.

Queres transmitir alguma mensagem com a tua música?

Eu quero com a minha música ser eterna. Eu acho que o maior problema dos artistas, hoje em dia, é quererem a fama e o sucesso muito rápido, o que leva a uma rápida queda no esquecimento. Eu tive dois ou três anos da minha vida completamente iludida, porque queria encontrar a fórmula do sucesso e ainda bem que me iludi muito cedo e que agora descobri a minha “espinha dorsal”. Eu já recebi muitos “nãos”, e ainda bem que os recebi. Já recebi inclusive comentários um bocado descaracterizadores de uma mulher! Percebi, então, que ia fazer as coisas do meu jeito e realmente agora é que as coisas começam a funcionar, porque eu percebi que tenho que fazer a música com o coração.

Eu tenho muito ciente na minha cabeça que os grandes artistas e os grande génios tem um imenso histórico de rejeição pela sociedade. São sempre aqueles que são desdenhados, que são estranhos. Para mim, levar ao Festival da Canção uma música chiclete significaria que o público estaria todo comigo e se quando o público está todo com uma pessoa, alguma coisa está mal! É sinal de que tu não tens “espinha dorsal”. Isto é a minha perspetiva do que eu acho que é a eternidade na música. Eu percebi isso quando as pessoas me começaram a dizer, por exemplo, – A música que tu vais levar ao Festival, eu das primeiras vezes não percebi! – e eu – Pois não. Porque eu não as escrevi de maneira a que tu a percebesses à primeira.

E eu, na final do Festival, quando vi a pontuação que tive pensei, por um lado, que – Eu tenho a certeza, absoluta que eu sou uma pessoa que vai singrar, que vai fazer o que quer. Por outro, que – Realmente eu precisava de ser rejeitada agora! Eu tinha que ter esta rejeição!

O que é que a participação no Festival da Canção trouxe para a tua vida?

Deu-me a certeza de que os grandes génios e aqueles que pensam sobre os próprios pensamentos tem de ser rejeitados! É o “estranhasse para depois se entranhar”.

Para mim, foi muito gratificante no sentido de eu perceber como é que as grandes coisas funcionam. O Festival da Canção faz-me lembrar quando os animais estão num matadouro para linha de abate, sabes? – Então vamos ver quem é o favorito. Quem são os favoritos? Quem é que se veste mal? Quem é que canta mal? – isto é de um nível de baixeza tremenda de pessoas que não tem mais nada que fazer. Eu, na semifinal, era a menos favorita e dei entrevistas para grupos de fanáticos que, quando comecei a fazer scroll apercebi-me que as pessoas, sem me conhecerem, queriam-me destruir.

Portanto, para mim, passar à semifinal só quer dizer uma coisa, que os verdadeiros artistas só se vem ao vivo quando são sentidos e ouvidos!

A maior vitória que tive no Festival da Canção foi a semifinal porque eu já sabia que, ao ir à final, ia combater com toda a gente, com managers, agências, editoras, etc… E eu era a única sozinha. Eu já sabia que não podia voar muito mais do que aquilo porque eu estava sozinha. Mas para mim, já é uma grande experiência porque quando dizem – Ficaste em último lugar na final! – eu não fiquei em último na final! Eu, no Festival da Canção, fiquei em 10.º lugar. Fiquei no meio da tabela porque 10 foram eliminados e eu tive uma semifinal a concorrer com uma Anne Victorino d’Almeida, e passei. Portanto, eu acho que isso já diz muito sobre a minha postura e sobre a minha forma de estar.

Levou-me a depreender das tuas palavras que o que importa não é o resultado final, mas sim o percurso, é isso que pensas?

Eu vou-te dar um exemplo muito consciente na minha mente, o Salvador Sobral, após ganhar a Eurovisão, disse – Não há coisa de mais triste do que ir a um concerto durante 1h30 e as pessoas estarem à espera de uma música, quando tiveste um ou dois anos a trabalhar num álbum inteiro. Ou seja, as pessoas não querem saber do teu álbum! As pessoas só querem ouvir aquela música. E isso, para um artista, é realmente triste.

Para mim ter ficado em último, eu não vejo como uma coisa má. Até vejo como uma superação porque, a mim, ninguém me ajudou para lá estar. E se eu ficasse em 5.º lugar, por exemplo, ninguém se ia lembrar de mim. Vão se lembrar dos The Black Mamba, da tal que foi Por um triz e da última classificada, que sou eu. Portanto as pessoas, a bem ou mal, vão saber o meu nome.

Porquê que decidiste participar no Festival da Canção, em detrimento de outros programas de talentos, como o The Voice, o Fator X, entre outros?

Eu nunca quis participar em programa nenhum porque eu não acredito na veracidade dos programas de televisão. Eu lembro-me de, há uns anos atrás, quando dava o Dueto Perfeito, de receber um e-mail (na altura ainda fazia covers) a ser convidada para ir ao programa e aquilo suou-me muito mal, porque se é um programa de livre submissão porquê que me estão a enviar um e-mail? Portanto, eu não acredito em programas nenhuns desses! Eu não vou me sujeitar a dar o meu latim a um programa televisivo que, à partida, já tem os seus vencedores e os seus finalistas.

Participei porque o Festival da Canção era uma coisa que eu queria como um “trampolim” na minha carreira.

Que significado é que a música tem para ti e que lugar é que ela ocupa na tua vida?

Só entendi o papel da música há muito pouco tempo, quando percebi que tinha de aceitar a pessoa que sou. Eu tenho a perfeita consciência de que eu vou ser uma pessoa a quem, tudo o que venha a ter é por mérito e eu percebi, neste último ano de 2020, que eu tinha que parar de negar aquilo que sou – eu, no fundo, sou um mensageiro e a música é o pretexto. Portanto, eu nem consigo, nem nunca terei a música como ambiciono, se não for uma boa mensageira.

A música só pode ter um lugar de mensagem!

És Alumni de CPRI, fala-nos um pouco sobre esta tua escolha em termos académicos?

Eu queria ser uma Médica Sem Fronteiras! E era muito boa aluna, aluna de quadro de excelência. Só que comecei a descobrir o que era namorar, as coisas mudaram um bocadinho e eu perdi-me um pouco na Matemática – aliás, eu perdi o fio à meada. Era muito boa aluna nas outras, mas a Matemática… eu não consegui e pronto tive de mudar. Eu queria entrar no Porto, em Relações Internacionais, porque havia muito a parte das Organizações Não Governamentais e eu queria este espírito humanitário! Queria mesmo voar e ir para longe…

Pensas conciliar a música com as saídas profissionais que o curso te proporcionou?

Não, não! Eu hoje tenho perfeita consciência que tirei CPRI para ter um discurso articulado e pelo pensamento político, porque eu adoro filosofia e adoro, é outra vez aquela história, de pensar sobre os pensamentos, e as Relações Internacionais e Ciência Política deram-me muito isso. Hoje, encontro-me a estudar Medicina Tradicional Chinesa, mais propriamente, Naturopatia.

Tenciono viver da música a full time, mas tenho um desejo muito grande de ter um centro de terapias alternativas e continuar a fazer música na mesma. Até porque eu não posso fazer uma coisa sem a outra. Portanto, de um jeito ou de outro, vai ter de ser assim.

Que conselho tens para dar a quem nos lê e que, como tu, quer também enveredar por uma arte, fora daquilo que está a estudar?

Eu acho que o principal conselho que eu tenho é que as pessoas percebam o que é que significa a especialização – nós somos ensinados, desde novos, a ser muito bons em muitas coisas, mas não somos ensinados a ser excelentes numa. Eu acho que nós perdemos muito tempo a querer abraçar o mundo quando temos o mundo nas mãos. E isso não faz sentido nenhum na minha cabeça – eu estava a estudar e a trabalhar, mas não tinha tempo para fazer música pois andava sempre cansada e cheia de sono. É que eu tinha um horário e um ritmo completamente diferentes de alguém que estuda normalmente e quando decidi que ia deixar o meu emprego, foi quando as coisas começaram a acontecer.

Depois, temos de parar com essa mania de ser “meias pessoas” e “meias-verdades”. Eu acho que as pessoas têm mesmo de assumir aquilo que são porque a evolução só vem daquele que diz “não”, quando todos os outros dizem “sim”. E não desistir dos sonhos! Porque realmente não há sonhos impossíveis. O que há no nosso país é uma vivência num sentido de conformismo, de comodidade, onde nunca ninguém nos ensinou a lutar pelos nossos sonhos.

  • Cátia Sabino