Atual modelo de gestão do PNSE não serve. Municípios exigem participação e segregação de poderes

Sustentando que o grande problema estrutural na Serra da Estrela é o modelo de gestão do Parque Natural, o Plano de Revitalização da Serra da Estrela aponta para a sua alteração.

Propões um modelo que segregue poderes e inclua os municípios, disse Carlos Lobo, consultor que colabora com a Comunidade Intermunicipal das Beiras e Serra da Estrela nesta matéria.


“Um modelo de gestão que seja participado, democrático, que respeite as boas práticas de governo. Que haja uma segregação entre quem prepara os regulamentos, quem os aplica e quem os fiscaliza, e que haja um sentido de apropriação e de responsabilidade, para que, se acontecer algo, seja possível responsabilizar alguém”, disse.

O também professor de direito na Universidade de Lisboa e antigo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais foi um dos convidados da Assembleia Municipal da Covilhã, para o debate sobre o Plano de Revitalização da Serra da Estrela que decorreu na sexta-feira à tarde.

Na sua intervenção explicou que em conjunto com os seis municípios que integram o PNSE foi feita uma análise crítica ao modelo de gestão atual, concluindo que “não funcionou e é preciso alterar”, dando como exemplo o grande incêndio de 2022 em que “ninguém assumiu culpas”.

“Tivemos uma catástrofe e ninguém se assumiu como responsável”. “Não há uma apropriação do Parque, ninguém tem direito de tutela e ninguém se responsabiliza sobre a área”, explicou.

Frisa que “é um modelo de cogestão do ICNF, imposto aos municípios”, em que estes não se reveem e em que se “está de costas voltadas”. “Toda a gente diz mal de toda a gente e no final, quando acontece uma catástrofe, toda a gente aponta a responsabilidade para os outros”, disse.

No documento é proposto que seja implementado um novo modelo de gestão, com a criação de uma entidade gestora que integre os seis municípios, Covilhã, Manteigas, Seia, Gouveia, Guarda e Celorico da Beira.

“Os municípios têm que efetivamente participar. Há uma sugestão de criação de uma entidade gestora composta pelos seis municípios que se vai responsabilizar pela gestão do parque, ou seja, os eleitos locais responsabilizam-se e prestam contas aos seus munícipes, para que não haja a situação em que ficamos a olhar para a serra a arder e ninguém consegue tomar uma medida efetiva da proteção, ultrapassando as fronteiras”, disse, vincando que “pela primeira vez os seis municípios se articularam para este modelo”.

Ainda sobre o modelo atual sustenta que o grande problema é que o ICNF, Instituto da Conservação da Natureza e Florestas, “determina, aplica e fiscaliza as regras”, não havendo segregação de funções. “O INCF é vítima de ser a única entidade e tem que fazer tudo e para muitas coisas não tem vocação”, explicou Carlos Lobo.

No novo modelo proposto “o elemento central é a segregação de funções entre a entidade gestora, a fiscalizadora, a legisladora e propositora. Na prática, agora, temos as quatro fundidas na mesma e não pode ser”, disse.

Explica que o modelo que se pretende é o que já existe na maioria dos parques europeus, também com um claro incentivo ao investimento privado na área do PNSE.

Alerta para os planos de investimento. “O sítio mais feio de Portugal não pode ser a Torre, o que resulta dessa lacuna de gestão”, frisando “que é quase terra de ninguém”.

Sustenta ainda que a concessão turística à Turistrela tem de ser revista, embora defenda “que não se deve antagonizar, deve conversar-se”. Aponta que na proposta consta “uma revisitação da questão da concessão, para que esta seja melhorada”.

O modelo proposto defende que o Parque seja remunerado pelos serviços de ecossistema que presta ao país, nomeadamente no carbono, na biodiversidade e na água, que são as três valências que são centrais do valor da Serra da Estrela e que não são remuneradas por ninguém.

É ainda proposta a criação de um regime fiscal especial, pois a área da CIM BSE é uma zona desfavorecida, bem como um incentivo ao cadastro, para se conhecerem os proprietários.