Cultura do mês: Série
A série norte-americana de 2017 estreou na Netflix Portugal em março deste ano e desde então está no Top 10 diário no país.
Parece que toda a geração tem uma “Sex and the City” para chamar de sua. Oito anos após o fim da série de grande sucesso estrelada por Sarah Jessica Parker, em 2012, estreava na televisão norte-americana a série “Girls”, criada por Lena Dunham e Judd Apatow. “Girls”, em comparação com “Sex and the City”, já atualizava alguns debates sobre o lugar das mulheres na sociedade e trazia temas mais contemporâneos, que se comunicavam melhor com a geração de jovens mulheres da época.
Hoje em dia, com temas ainda mais atuais, temos “The Bold Type”, série de 2017 do canal Freeform que acompanha a história de três jovens amigas que trabalham numa revista feminina em Nova Iorque. No decorrer da trama, Jane Sloan (Katie Stevens), Kat Edison (Aisha Dee) e Sutton Brady (Meghann Fahy) são um retrato fiel do que é ser uma jovem mulher nos dias atuais, tendo que lidar com questões como relacionamentos amorosos, desenvolvimento profissional, amizades, decisões de vida, etc.
Desta maneira, parece que “The Bold Type” não acrescenta em nada às produções dedicadas ao público feminino que são tão abundantes na televisão norte-americana. No entanto, os diferenciais da série são justamente a atualidade e a relevância dos temas tratados. Assédio sexual no trabalho, cancro de mama, o papel dos homens na luta contra o machismo, vontade ou não de ser mãe… Esses são apenas assuntos que a série aborda de maneira bastante responsável e reflexiva, sem se propor a dar respostas certas ou inflexíveis, mas sim fazer-nos pensar e discutir sobre.
Outro ponto positivo da produção é que ela não segue o padrão clássico de participação feminina observado em boa parte dos filmes e séries hollywoodianos. Lá em 1987, a cartunista norte-americana Alison Bechdel produziu uma tirinha chamada “Dykes To Watch Out For” (em tradução livre, seria algo semelhante a “Lésbicas com quem se preocupar”), em que ela questionava a presença feminina nos filmes. Com o tempo, criou-se o Teste de Bechdel, segundo o qual as produções devem atender aos seguintes requisitos para serem consideradas aceitáveis do ponto de vista da representatividade feminina: ter, ao menos, duas personagens femininas; as personagens femininas devem conversar entre si em alguma cena; devem conversar sobre algo que não seja homens.
Infelizmente, vemos que boa parte dos filmes e séries ainda não atendem a esses padrões mínimos. Hoje em dia, é claro que sabemos que existem muitas outras questões para aferir o quão bem representadas estão as mulheres na tela. No entanto, este ainda é um critério relevante no que diz respeito ao assunto e “The Bold Type” realiza isso de maneira magnífica. Durante os episódios, o foco principal da trama é muito mais a amizade das jovens entre si do que os seus relacionamentos amorosos com homens, por exemplo.
Outro estereótipo desconstruído pela produção é o da “chefe rigorosa abusiva”. A história é baseada na vida de Joanna Coles, editora executiva da revista Cosmopolitan, e por ter como plano de fundo uma redação de revista em Nova York, a tendência é de acharmos que seria muito semelhante ao enredo de “The Devil Wears Prada”. Porém, diferentemente do filme de 2006, a editora-chefe da revista Scarlet, Jacqueline Carlyle (vivida por Melora Hardin), não tem nada a ver com Miranda Priestlt (Mery Streep). Ela é uma chefe rigorosa, porém humana, que sabe liderar pessoas sem precisar humilhá-las, de maneira que a sua participação na série não romantiza as relações problemáticas no ambiente de trabalho, como é muito comum.
Ou seja, apesar de não ser perfeita, “The Bold Type” apresenta um entretenimento aliado a questões importantes e as suas quatro temporadas valem a maratona. Na Netflix encontram-se disponíveis todos os episódios já lançados e a quinta e última temporada irá ao ar no dia 26 de maio nos Estados Unidos, no canal Freeform, ainda sem previsão de estreia em Portugal.
-Malu Araújo