Incêndios: Luís Marques descreve combate na Estrela e levanta cenário de “incendiarismo”

O concelho da Covilhã registou até esta altura 68 incêndios, sendo que 11 ignições ocorreram na mesma zona em que se iniciou o grande incêndio da Serra da Estrela, antes mesmo dessa ocorrência. Depois, e no mesmo fim de semana, ocorrem mais cinco, todas na encosta Vila do Carvalho/ Atalaia/Gibaltar. “Um número de ocorrências anormal e que preocupa”.

Um cenário que foi descrito pelo comandante dos Bombeiros Voluntários da Covilhã, Luís Marques, ontem, durante a Assembleia Municipal. O responsável frisa que esta situação já foi reportada às autoridades que estão a investigar, vincando que “poderá haver aqui algum cenário de incendiarismo”.


Na sua intervenção na Assembleia, o também coordenador da Proteção Civil Municipal, destacou que para além do grande incêndio da Serra da Estrela, no concelho aconteceram mais 3 de dimensão assinalável, um no Vale das Cortes/Unhais, outro no Ferro e um terceiro no Canhoso, sendo que “os restantes foram debelados na primeira meia hora”.

No grande incêndio da Serra da Estrela, que Luís Marques dividiu em duas fases, uma entre 06/08 e 13/08 e outra que ocorreu entre 15/08 e 19/08 caracterizada por “uma impossibilidade completa de combate”, em que arderam cerca de 10 mil hectares em 14 horas, colocando muito rapidamente aldeias e pessoas em perigo.   

O responsável descreveu situações limite no combate às chamas, dificultadas por “falta de acessos, temperaturas elevadas e humidade muito baixa”.

Na primeira fase Luís Marques descreve um incêndio com uma “grande progressão inicial”, propiciada pela orografia do terreno, com grande declive, mas não põe de parte o facto de o alerta inicial ter sido tardio. “Quando o primeiro carro sai do quartel já se vê um grande clarão naquela zona”, afirma.

A juntar a esta situação o comandante descreve que, rapidamente, o fogo tomou grandes dimensões, uma vez que havia incapacidade de os bombeiros chegarem ao local com “linhas de mangueira”, vincando que o primeiro veículo ficava a mais de 500 metros e todo o combate, pelos flancos em direção á cabeça do fogo, foi feito com ferramenta manual, num declive de mais de 50%.

Entre os obstáculos ao combate fala em falta de acessos, sendo o recurso a meios aéreos a única intervenção e que estes tinham que se deslocar longe para reabastecer, o que era outra dificuldade.

“A rede primária está definida na lei como uma rede circular interligada entre as várias zonas, mas esta é uma das poucas que termina num caminho sem saída, na Lapas das Cachopas”. É uma das questões que está no plano para o ICNF executar porque é a este instituto que compete esta tarefa”, disse.   

O responsável descreveu as operações que foram efetuadas para tentar dominar o incêndio nos vários momentos. Um “combate difícil”, que mesmo à noite não teve as denominadas “janelas de oportunidade”, já que as temperaturas não baixavam e a humidade do ar não aumentava.

As temperaturas elevadas e a seca severa também são apontadas como condicionantes neste combate uma vez que os combustíveis finos mortos, como palha e carumas, estavam apenas com cerca de 11% de humidade.

Descreve ainda “muitas coisas que nunca tinha visto”, como é o caso de alguns populares fazerem contrafogo para tentar salvaguardar as suas habitações e que resultaram em novas frentes de fogo, todas de grandes dimensões.

Se esta primeira fase do incêndio se desenvolveu sem quase afetar habitações, o mesmo não se pode dizer da segunda, que começou no dia 15. “Aqui desenvolve uma enorme intensidade” e a prioridade foi proteger casas e pessoas.

Muito rapidamente aldeias ficaram em risco, com o incêndio e tomar proporções que não permitiam o combate, “arderam 10 mil hectares em apenas 14 horas”, destacou.

Uma situação de que se retiram lições para o futuro, disse o comandante, apontando a criação de “oportunidades de combate”, em que se destacam a “criação de aceiros, melhoria da rede primária, criação de floresta em mosaico com espécies resistentes ao fogo, cortes seletivos nas zonas de pinhal para garantir que há faixa de proteção e a criação de novos pontos de água a uma altitude entre os 900 e os 1200 metros de altitude, bem como uma clara hierarquização da cadeia de comando no teatro das operações”, disse

Uma descrição que terminou com os membros da Assembleia Municipal a aplaudir de pé, reconhecendo o trabalho desenvolvido pelos operacionais no terreno.